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Foto do escritorAlan de Paula

Qual o sentido da sua vida?

Atualizado: 13 de mai. de 2019

Qual o sentido da vida? Qual o sentido da sua vida? Você sabe porque este é o sentido que guia a sua vida? Você está conseguindo seguir a vida de acordo com ele?

Já pensou que talvez a vida não tenha sentido algum (dado a priori) a não ser o sentido inconsciente que demos à ela a partir do que fantasiamos que os nossos Outros maternos e paternos queriam e desejavam de nós?

Em essência, somos aquilo que inconscientemente acreditamos, em algum momento primordial, que foi desejado e pedido para sermos, e é isso que dá o sentido (propósito e direção) do que pensamos, sentimos, percebemos e percorremos ao longo da vida.

Vale ressaltar o caráter fantasioso da construção desse sentido de vida. Pois, trata-se sempre de uma fantasia, de uma tentativa de leitura e deciframento do que os Outros maternos e paternos querem e desejam de nós. Esses Outros são os que vão dando sentido às nossas experiências, traduzindo o mundo para nós, nomeando nossas sensações ("bebê tá sentindo fome", "bebê tá com frio"...) e com isso nos apresentando a linguagem que nos permitirá ancorar nossos afetos e nos inserir no campo social.

Contudo, por mais que esses sentidos do que somos ("você é o príncipe da mamãe", "você é um capeta", "você [é aquela que] só me dá trabalho"...) e do que sentimos nos sejam dados por esses Outros, nós os internalizamos a partir do que fantasiamos que sejam essas mensagens. Lembro de um analisando (atendido por um analista amigo meu de outra parte do Brasil) que procurou análise movido por uma angústia em relação à sua homosexualidade. Ele lembrou, em análise, de seu pai, um militar machista e receoso de não ter um filho hetero, lhe dizer quando criança: "meu filho nunca brinque com meninas, sempre brinque com meninos". E o paciente se dá conta, então, que vem seguindo à risca até hoje a recomendação do pai.

E essas mensagens que recebemos e fantasiamos se apresentam à nós como imagens, primeiramente emprestadas e depois internalizadas, e que possibilitam uma consistência de ser, um sentimento de integração das diversas experiências que o corpo do sujeito vinha sendo bombardeado. E é a partir dessa consistência imaginária que o eu se constitui enquanto um sentido, uma direção a percorrer.

Portanto, nosso eu (o que sabemos de nós e como nos direcionamos na vida) é imaginário, no sentido de ser um conjunto de imagens e, também, de ser ilusório. Porque ilusória? Porque são imagens que construímos de nós mesmos a partir das fantasias das imagens que nos foram ofertadas a ver por nossos pais. E porque são imagens das nossas experiências, registros, e não as experiências em si. Nesse processo de registro de cada experiência vivida, uma parte se registra e outro tanto fica de fora. Mas fica de fora apenas do registro simbólico, mas continua a existir no sujeito enquanto afeto solto da experiência.

E qual a importância disso? A importância é que isso que fica de fora passa a ser o que de mais real existe em nós, e é o que nos possibilita entender o funcionamento de nosso psiquismo como muito além do nosso eu. Nos possibilita entender, por exemplo, porque: nos sentimos movidos a fazer coisas que vão de encontro aos nossos valores, desejamos coisas que nos parecem absurdas, repetimos compulsivamente experiências de vida e escolhas que nos farão sofrer. Ou seja, nos permite compreender que é exatamente essa parte do nosso psiquismo que não foi registrada simbolicamente (e nunca será totalmente) que incansavelmente nos afetará, como um fantasma que não cessará de nos assustar em busca de se tornar vivo.

Em alguns casos, o encontro inevitável com essa nossa outra parte totalmente desprovida de sentido pode ser brutal a ponto de não haver tempo de proteger a imagem criada do eu que é o que tampona, de alguma forma, isso que Freud nomeou de A Coisa. Nesses casos pode haver uma rachadura da imagem, como num espelho, levando o sujeito à um vazio existencial, pois, é a imagem do eu que dá o sentido de existência e direção de vida. É o que acontece em muitos casos de suicídio quando o sujeito não vê mais sentido de viver apesar da sua vida concreta aparentar estar muito bem (filhos bacanas, casamento feliz, dinheiro, saúde...etc).

Albert Camus, em seu livro "O Mito de Sisifo (Ed, Guanabara, 1989) nos fala exatamente dessa perda de sentido de vida quando muitas vezes o sujeito se depara com o absurdo que é perceber que a vida não corresponde aos seus anseios, que o mundo concreto se apresenta de uma forma absurdamente brutal e incompreensível, que todos os sentidos construídos pelo sujeito não parecem mais corresponder à realidade, restando ao sujeito decidir entre a vida e a morte, entre o "to be or not to be", de Shakespeare. Para Camus, esta deveria ser a verdadeira e mais fundamental questão filosófica: saber porque devemos viver (ou ser) e morrer (deixar de ser).

Porém, essa experiência de vida e morte, sentido e não sentido, não precisa ser necessariamente vivida no plano concreto, ou seja, ter que decidir se tiro ou não a minha vida quando me defronto com situações que abalam meus sentidos de vida, meu eu. Mas podemos experimentá-las numa análise, onde é possível, de forma singular, conhecermos os sentidos que construímos e, com isso, nos possibilitarmos uma descolagem da imagem construída e da obrigatoriedade de perseguí-la. Nos dá, ainda, uma certa liberdade de poder criar novos sentidos, mais prazerosos e menos sofridos, para uma existência absurdamente e dolorosamente sem sentido. SEm TI DÓi!

Imagem: Gustav Klint, Vida e Morte, 1916.

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